Tensão e emoção no debate sobre o atendimento a estudantes com deficiência

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Com a participação de especialistas, educadores e ativistas e sob a perspectiva da inclusão, Senado Federal abriu nesta terça-feira (10), em audiência conjunta das Comissões de Educação e Assuntos Sociais, o ciclo de debates sobre o papel e as condições das escolas e instituições especializadas para estudantes com deficiência. 

Com apoiadores, por um lado, pela continuação do atendimento pelas escolas especiais e de instituições especializadas e por outro, com apoiadores ao atendimento de deficientes em escolas regulares, a audiência pública teve momentos de tensão entre os dois grupos e de pura emoção nos depoimentos de deficientes atendidos pelas escolas públicas especiais e instituições especializadas sem fins lucrativos como é o caso do CDV e do Pestallozzi.

Segundo o senador Izalci Lucas (PSDB/DF), autor do requerimento e presidente da Sessão, o primeiro dia de debates teve esclarecimentos importantes sobre a legislação, bem como sobre a necessidade de recursos para que as escolas possam oferecer educação de qualidade aos estudantes com deficiência.

Ficou claro que a legislação não impede a continuação das escolas especiais e deinstituições especializadas no atendimento, mesmo porque se isso ocorrer, estaremos tirando a liberdade de escolha do aluno e/ou familiares”, disse o senador. 

Por outro ladoIzalci afirmou ainda que, as escolas públicas regulares carecem de profissionais capacitados e de infraestrutura para o atendimento educacional especializado  AEE que tem como função identificar, elaborar e organizar recursos pedagógicos e de acessibilidade que eliminem as barreiras para a plena participação dos alunos, considerando suas necessidades específicas. O senador defendeu a promoção de debate sobre o tema na Comissão Mista de Orçamento (CMO).

Já o senador Flávio Arns, presidente da Comissão reforçou a importância dos debates: “Nós vamos discutir bastante ouvindo as famílias, ouvindo as pessoas com deficiência, ouvindo as pessoas que atuam na área, o Executivo, o Ministério da Educação, porque compete ao Senado fazer esse debate. Com absoluta tranquilidade segurança, escutando, chegando a conclusões tanto quanto possível pra boa parte das pessoas convergentes”.

Matrículas para educação especial aumentaram 119%. 

A professora Zara Figueiredo, da Secretaria de Educação Continuada e Alfabetização de Jovens e Adultos do MEC, apresentou a evolução das matrículas na modalidade Educação Especial. Entre 2008 e 2022, as matrículas aumentaram 119%. Zara afirmou ainda que, segundo o Inep, 45% dos alunos com deficiência estavam com idade acima da adequada para a série de ensino em que se encontravam. A professora também falou sobre a falta de estrutura das escolas, especialmente das salas de estudos multifuncionais, rampas, banheiros acessíveis e sinais sonoros, dentre outros. “Essa permanência qualificada passa também por uma infraestrutura de qualidade”, ressaltou Zara.

Nada sobre nós, sem nós

Mãe de dois filhos deficientes cego e surdo cego – Ellen Regina Morais, professora da Secretaria de Educação contou sua saga para educar os filhos, um psicólogo e outro mestrando da UnB, história depois corroborada pela fala de Iury, cego e surdo que com a tradução da linguagem de libras falou sobre sua experiência de educação no Centro de Ensino Especial de Deficientes Visuais (CEEDV). Para Ellen, “as pessoas precisam ver que é uma escola de Brasília e isso não ocorre em outras partes do país, pois as escolas não têm sala de recursosE continuou: “Se fala que temos que tratar todos de forma igual e com dignidade, mas quando se trata de pessoas com deficiência, podemos colocar todos no mesmo saco, na mesma escola, como se isso fosse necessário para que tudo desse certo”. 

Para a professora Ellen, é preciso dar ao deficiente o direito de aprender, respeitando o seu euSegundo ela, não é inteligente pensar que todos no mesmo espaço vão fazer a inclusão acontecer, baseado somente na legislação. Inteligente é respeitar o princípio da dignidade humana. “Ah, mas eles estão na escola e fomentam a igualdade. Ah, eles deixam de ser excluídos. Ah, eles ajudam pessoas a serem melhores. A pessoa com deficiência, em geral, tem que parar de ser ratinho de laboratório para os outros quererem evoluir. Nada sobre nós, sem nós”, concluiu Ellen Morais.

Anos sem aprender nada

Totalmente dependente e sem condições de aprendizado na escola regular, Carlos Henrique Viana ´passou os primeiros anos de sua existência tentando aprender e sofrer humilhações na escola regular, até que foi para o Instituto Pestalozziano e sua vida mudou. Aprendeu a ler, a escrever, as quatro operações matemáticas e hoje é Autodefenssor Nacional do Movimento Pestalozziano, uma instituição que atua há mais de 90 anos em defesa dos direitos da pessoa com deficiência no Brasil. Viana falou das violências que sofreu e das dificuldades de aprender na escola regular. 

“Estudei na rede regular muitos anos. Não fui bem aceito, bem inserido, tive muitas dificuldades para ter a leitura e a escrita e as quatro operações da matemática. Também fui muito humilhado, maltratado, machucado, pelos próprios colegas que não tinham nenhum tipo de deficiência”, revelou Viana.

Autonomia e conhecimento

Mãe de autista, a vice-presidente do Movimento Orgulho Autista (Moab) e membro do Conselho dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Distrito Federal (Coddece), Viviani Guimarães falou de sua experiência como mãe de autista e destacou que o cérebro de todas as crianças está apto para aprender, sobretudo no período da primeira infância, que vai do zero aos seis anos de idade. Ela ressaltou ainda que a estimulação precoce é fundamental para o desenvolvimento educacional, das possibilidades cognitivas e autonomia futura dos estudantes.

Direito de escolha

O defensor público e membro do Conselho dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Distrito Federal WemerHesbon Borges da Silva esclareceu que a escola especializada faz parte da rede regular de ensino, e que o sistema inclusivo pode ter dentro dele uma escola comum, com classes especializadas que permitirão o desenvolvimento e o potencial de habilidades físicas e intelectuais por parte de alunos portadores de deficiência.Wemer ainda explicou que a palavra “preferencialmente” na legislação é correta e dá a opção da escolha. Portanto a lei não restringe a educação para deficientes à escola regular.

O debate ainda contou com a participação Laís de Figueirêdo Lopes, Coordenadora da Frente Jurídica Coalizão Brasileira pela Educação, da representante da Undime, Andreia Pereira da Silva de das senadoras Mara Gabrilli (PSD/SP), Leila Barros (PDT/DF), Teresa LeitãoDamares Alves (Republicanos/DF). 

O ciclo de debates continuará no dia 17 de maio (quarta-feira) com mais uma rodada de discussões sobre o tema.

 

Fotos: William Sant’Ana

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